Renato Gomes – Pastor da Comunidade de Cristãos de Botucatu
Imagem bíblica: Caim, agricultor e
Abel, pastor. Duas profissões arquetípicas no início da tradição humana.
Ofícios ligados à natureza, porém antagônicos no sentido de que na agricultura
se requer a transformação da terra e no pastoreio a conservação da terra com
seus recursos naturais.
Processo evolutivo lembra a questão
do acesso à terra (Caim), enquanto Abel é um nômade, que caminha com o rebanho,
não delimita a terra, não a cerca, segue o rebanho no seu pastejar.
Na queima de incensos ofertados à
Deus a fumaça de Abel sobe aos céus e agrada a Deus, enquanto a de Caim desce à
terra, gerando uma tensão, uma polaridade, uma dualidade que não é resolvida e
culmina com a morte de Abel por obra de Caim, que fica assustado com a
possibilidade de que todos queiram se vingar dele.
Deus então tranquiliza-o,
deixando-lhe (e a seus descendentes) uma ‘marca’ (que não é explicitada), que
acompanha o seu povo.
Essa dualidade inicial prevalece por
toda a história humana.
Depois da morte de Abel, Adão e Eva
estão tristes. Deus então lhes dá um novo filho: Set. Esta linhagem levanta
altares e agradece a Deus, surge então o sacerdócio.
Ou seja, de um lado, os que trabalham
na terra, alteram-na, aprofundam sua ação na terra, como Caim. De outro, o que
vê a terra como algo a ser preservado, no estado do Éden Paradisíaco, com suas
forças originárias, como Abel e Set.
Outros irmãos e outra tensão estão
presentes em Isaías e Jacó, o filho primogênito.
Por meio desta dualidade não se
resolve o problema. Na modernidade esta questão está presente e pode-se
identificar a corrente ‘de Abel’ na intenção de curar, de metamorfosear a terra
e a corrente ‘de Caim’, de preservá-la tal como é.
Voltando ao Antigo Testamento: Caim
teve 3 filhos:
Jabal construtor de tendas, nômade, peregrino, pastor;
Jubal que é músico e está na esfera entre o mundo
sensorial de Caim, da técnica, e o mundo não material, da inspiração artística.
Representa uma tentativa de unificação dos dois extremos, uma ponte; e
Tubal Caim, ferreiro, tem o mesmo sentido de Caim, de
transformar a matéria.
O trabalho com a Agricultura
Biodinâmica (AB) também atua no sentido de resgatar a tradição antiga onde uma
parte do alimento produzido era consumida, uma parte guardada para novo plantio
e uma terceira parte, a melhor, oferecida aos Deuses, independente da cultura.
Hoje, somente a produção interessa. A
‘Monsanto’ produz para o agricultor a semente, o agrotóxico etc.
Necessidade de manifestar o elemento
trinitário: consumo, reserva e oferta ao Divino.
Introdução de Steiner ao curso
agrícola: questão terreno-cósmica; extrair do espírito forças hoje
desconhecidas; agricultura melhorada e que a vida dos homens possa prosseguir
na terra.
Renato alerta para o risco da AB
servir ao sentimento de egoísmo de quem passa a ter alimentos ‘saudáveis’
enquanto outros não o tem.
É necessário preencher o espaço de
separação entre ‘céu e terra’, construir a ponte entre o organismo físico da
terra e as forças cósmicas.
O trabalho religioso cristão, ao
longo dos séculos, representa a tentativa de união entre ‘Caim e Abel’, a
conquista de um terceiro elemento, a união entre o ‘céu e a terra’, o ‘pão da
vida’, a imagem que Jesus Cristo traz.
O trabalho agrícola começa a ter
sentido quando encontra a relação com o ‘elemento do meio’: produzir alimentos,
produzir boas sementes (a perpetuaçao e a parte entregue ao Divino (trabalho
espiritual-religioso).
O que precisa ser alimentado e sanado
hoje é a TERRA.
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